domingo, 18 de janeiro de 2009

A SÉTIMA ARTE ll

O Brasil Como Ele É

"Caixa Dois" questiona a honestidade

por Francisco Russo

Se em Hollywood a moda é a adaptação de histórias em quadrinhos, por aqui o alvo é o teatro. Várias peças foram adaptadas para o cinema nos últimos anos: A Máquina, Fica Comigo Esta Noite, Irma Vap, Vestido de Noiva e Trair e Coçar, É Só Começar são apenas alguns exemplos. O motivo deste fenômeno local é incerto. Há a alegação de que o Brasil não possui bons roteiristas de cinema e, por isso, é melhor apostar em textos feitos para o teatro. Uma justificativa duvidosa se lembrarmos de roteiros como os de Central do Brasil, Redentor e Cidade de Deus, com o último sendo até indicado ao Oscar da categoria. Outra causa seria comercial: ao apostar em uma peça conhecida, tenta-se atrair ao cinema o público que a viu nos teatros. O que é também duvidoso, visto que nenhuma das adaptações já lançadas foi um sucesso de bilheteria, apesar da fama de várias das peças. Independente de qual seja sua justificativa, Caixa Dois é a mais recente aposta deste ramo. Uma boa aposta, por sinal."Caixa Dois", a peça, foi escrita e estrelada por Juca de Oliveira. Lançada em 1997, levou mais de um milhão de pessoas aos teatros e permaneceu em cartaz por 6 anos. Boa parte deste sucesso se deveu à forma como é retratada uma das mazelas brasileiras, a corrupção, um tema presente na época de seu lançamento e que permanece atual nos dias de hoje. Caixa Dois, o filme, mantém esta preocupação, até mesmo atualizando certas situações aos escândalos recentes. O ritmo ágil dos diálogos também é mantido, com algumas tiradas inspiradas. Porém Caixa Dois não trata apenas da corrupção entranhada no país, mas também da honestidade de seus cidadãos. Um tema abordado de forma implícita, mas facilmente percebido nos rumos de sua história.Tudo começa quando o banqueiro Luiz Fernando (Fúlvio Stefanini) enfrenta problemas para realizar uma transação em que ganharia R$ 50 milhões, já que seu doleiro entrou em coma. Ele convence sua secretária, Ângela (Giovanna Antonelli), a ser sua laranja, de forma que a quantia seja depositada em sua conta. Porém, devido a um erro de Romeiro (Cássio Gabuns Mendes), seu funcionário, a quantia é depositada na conta de Angelina (Zezé Polessa), uma professora honesta que teve seu marido, Roberto (Daniel Dantas), demitido pelo banco de Luiz Fernando. Ao saber do ocorrido, ela se recusa a autorizar o estorno.O mais interessante de Caixa Dois é observar as reações dos personagens em meio a este mar de irregularidades. Ângela aceita imediatamente ser laranja de seu patrão, por acreditar que seu futuro profissional depende da beleza de seu corpo. Romeiro, que estudou em Harvard, está entranhado até a alma nas falcatruas e se preocupa apenas com seu quinhão do montante. Luiz Fernando mantém a imagem de amigo de seus funcionários e clientes, mas não pensa duas vezes antes de demiti-los ou enganá-los. Até Angelina, cuja recusa pode ser compreendida como uma espécie de vingança pela demissão do marido, muda de atitude ao vislumbrar a chance de tornar-se milionária. Ou seja, todos os personagens mudam de postura ao notar a possibilidade de levar alguma vantagem na história. E, neste momento, não importa se a vantagem é obtida de forma lícita ou não. Alguns personagens até levantam questões morais, mas isto não os impede. Fica então a pergunta: vale tudo para conseguir uma situação de vida melhor?Esta é a grande questão do filme. O panorama da corrupção serve para situar a história e aproximá-la da realidade brasileira, visto que a todo instante surgem escândalos do tipo. Mas a grande crítica não é à corrupção propriamente, mas à honestidade de cada um. O que, no fim das contas, acaba sendo a causa da existência da própria corrupção. Esta profundidade alcançada pelo texto de Juca de Oliveira, e mantido no roteiro escrito pelo próprio em parceria com Márcio Alemão, é o que há de melhor em Caixa Dois.Entretanto o filme também tem seus problemas. O maior deles é sua trilha sonora, que em certos instantes chega a irritar pelo exagero. Há também momentos em que parece teatro filmado, um problema recorrente nas recentes adaptações feitas. Porém a boa atuação do elenco como um todo, com destaque maior para Fúlvio Stefanini, e o roteiro compensam estas falhas. Caixa Dois é um bom filme, que diverte sem fazer gargalhar e que merece ser, acima de tudo, refletido.

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