PÉS DUROS E MELETES
“Povo sem história é povo ignorado, povo esquecido, sem nome, sem valor”.
Aníbal Lopes Viana
Vitória da Conquista é um município brasileiro do estado da Bahia. Sua população, conforme o IBGE, em 1º de Julho de 2008, era de 313.898 habitantes, o que a torna a 3ª maior cidade do estado e também do interior do Nordeste (excetuando-se as regiões metropolitanas).
Possui um dos PIBs que mais crescem no interior desta região. Capital regional de uma área que abrange aproximadamente 70 municípios na Bahia, além de 16 cidades do norte de Minas Gerais. Tem a altitude, nas escadarias da Igreja Matriz, de 923 metros podendo atingir mais de 1.000 metros nos bairros mais altos. Possui uma área de 3.743 km².
História:
O Arraial da Conquista foi fundado em 1783 pelo sertanista português João Gonçalves da Costa, nascido em Chaves em 1720, no Alto Tâmega, na região de Trás-os-Montes que com dezesseis anos de idade, veio para o Brasil a serviço de D. José I, Rei de Portugal, com a missão de conquistar as terra ao oeste da costa da Bahia.
Anteriormente já havia lutado ao lado do Mestre-de-Campo João da Silva Guimarães, líder da Bandeira responsável pela ocupação territorial do Sertão, iniciada em 1752. A origem do núcleo populacional está relacionada à busca de ouro, à introdução da atividade pecuária e ao próprio interesse da metrópole portuguesa em criar um aglomerado urbano entre a região litorânea e o interior do Sertão. Portanto, integra-se à expansão do ciclo de colonização dos fins do século XVIII.
Quando se fala em história de um povo, a cidade de Vitória da Conquista possui uma das mais belas. Não é uma história simples, acomodada, pobre em acontecimentos. Mas, antes de tudo, uma história rica, contundente, marcada por fatos que não saem da cabeça das pessoas, principalmente daquelas de mais idade. Sangue, violência, bondade, sabedoria, benevolência, trabalho, poesia, fatos hilariantes, dinamismo, coragem, arrojo, visão, fé. São alguns dos ingredientes preponderantes na história de nossa cidade.
Não se trata de sermos saudosistas, preso ao passado. O que nos faz voltar ao passado para pesquisar nossa história ou qualquer outra história nos ajuda a compreender nosso presente e refletir, deduzir e produzir o nosso futuro. Entendo o porquê de ter escutado muitas pessoas dizerem que os anos 50, 60 e 70 foram os melhores anos para se viver, pois quando olhamos para uma fotografia antiga nós resgatamos aquele elo entre a foto e a emoção gerada por ela, relativa ao período vivido. Na grande maioria das vezes, são lembranças boas e positivas porque nos ligamos aos saudosos valores da época, momentos felizes, a paz da época, o encontro na praça ou nas portas das casas para um bate-papo descontraído no final da tarde, a música que marcou uma época, a serenata, o serão, uma brincadeira, a disciplina, o respeito. Enfim, nos lembramos de algo que era bom, mas que na época não valorizamos e que sentimos falta agora.
Alguém pode ver as fotos e achar que as informações são superficiais, mas a depender do interesse e da curiosidade de cada um, talvez cada foto seja apenas o ponto de referência para uma pesquisa mais aprofundada. Têm-se a possibilidade de se escrever vários livros com temas inspirados em várias fotos. Poderíamos analisá-las, tendo como base o que representava naquele momento e com certeza quem quiser aprofundar algum tema irá encontrar várias possibilidades.
Curiosidades:
Um Príncipe Alemão em Conquista. Como um príncipe veio parar aqui?
No ano de 1817, passou pelo então Arraial da Conquista vindo de Minas Gerais um príncipe Alemão Maximiliano Alexander Philip nascido no palácio de Wied Neuwied, em 1782. Chegou à Paraíba em junho de 1815, em julho desembarca no Rio de Janeiro. Em março de 1817 passou pelo Arraial da Conquista, naturalista e conhecedor de botânica, encontrou na região de Conquista espécimes raras da flora e fauna dos trópicos, que foram recolhidas e levadas para a Alemanha, onde foram depositadas em museus e universidades daquele país.
Ele conta que encontrou no Arraial o capitão-mor Antonio Dias de Miranda, filho de João Gonçalves da Costa que ficou alojado em sua casa. O Arraial de Conquista é quase tão importante quanto qualquer vila do litoral. Contando-se aí umas quarenta casas baixas e uma igreja em construção por conta de João Gonçalves da Costa e do capitão-mor Miranda, já que os moradores são pobres. A venda de algodão e a na geração de recursos para os moradores. Grande parte dos moradores do Arraial compõe-se de trabalhadores e de rapazes desocupados, que ocasionam muitos distúrbios, pois não há polícia nesta localidade. A malandrice e uma inclinação imoderada para as bebidas fortes são traços distintivos do caráter desses homens; daí resulta disputas e excessos freqüentes que torna detestável esse lugar, de má fama para as pessoas mais sérias e consideradas, que vivem em suas fazendas espalhadas em torno. Fomos freqüentemente incomodados por pessoas embriagadas que nos aborrecia. Trazendo cada um, como é perigoso costume da terra, um estilete ou um punhal na cintura, esses homens grosseiros e imorais, que nenhuma espécie de vigilância contém freqüentes assassínios e outras violências. Eis porque nunca será demais recomendar aos viajantes que procedam com a máxima cautela em Arraial da Conquista, para evitarem, para si e para o seu pessoal, aborrecimentos muito sérios.
Em novembro de 1817, retorna para a Europa, levando consigo o índio civilizado, de nome Quack, que o acompanhou durante sua expedição. Em 1840 foi eleito membro da Academia de Ciências Prussianas
Estes são alguns relatos do Príncipe sua passagem por Conquista. Visitando Mucugê me chamou a atenção a informação de que outros dois príncipes alemães que passaram por lá, então já era normal a visita deles aqui no Brasil na época.
Os índios:
As nações, Pataxó, Ymboré (Aimoré – Botocudos) e Mongoió foram os primeiros habitantes da uma vasta região denominada “Sertão da Ressaca” que era delimitada pelos rios das contas, Pardo e Jequitinhonha. Cada nação indígena tinha suas características:
Ymboré ou Botocudo:
Viviam em uma extensa faixa de terra entre Minas Gerais, Ilhéus, Porto Seguro e Espírito Santo. Tinham como característica a capacidade de se dividirem em inúmeros subgrupos e se dispersarem em extensas áreas, dando a impressão de serem em maior numero do que realmente eram. Ganhou dos portugueses o nome de Botocudo pelo fato de usarem nas orelhas e nos lábios um ornamento chamado botoque, que eram colocados em rituais. Eram considerados canibais, mas não há nada que comproves essa hipótese.
Segundo descrição do príncipe Maximiliano, eles tinham a cor avermelhada, cabelos fortes e pretos, duros e lisos, considerados bravos e muito temidos lutaram e resistiram até o seu extermínio, pela manutenção do seu território. Eram nômades, viviam da caça, pesca, frutos e raízes. Gostavam de pintar o corpo e usavam o urucum e o jenipapo, gostavam do vermelho e preto. Às vezes, usavam pinturas longitudinais, colorindo um lado de preto e deixando o outro sem pintura para representar a noite e o dia.
Pataxó:
Habitavam a área entre os rios Cachoeira e Pardo. Eram nômades, andavam em pequenos grupos sendo uma das últimas tribos a serem dominadas pelos portugueses após constantes ataques que provocaram a redução da tribo.
Não tinham aparência física diferentes, de estatura mediana, não se pintavam e quando pintavam faziam traços nas cores vermelho e preto. Ainda segundo o príncipe “os Pataxós se aliavam contra os Ymborés e tratavam os prisioneiros como escravos. Eram desconfiados e reservados, e não aceitavam que os filhos fossem criados entre os brancos, como as outras tribos o fazem prontamente”.
Viviam da caça e frutos e o animal predileto para sua alimentação era o macaco. Não davam muita importância para a pesca.
Mongoió:
Viviam entre os rios Pardo, Jequitinhonha e das Contas. Eram fortes de estatura mediana de pele morena. Também foram colonizados, porém, lutaram bravamente para defender seu território. Viviam da caça, da pesca e diferente das outras tribos, os Mongoiós praticavam a agricultura, plantavam batata-doce, feijão, banana, milho, melancia etc. O plantio era realizado no período das chuvas. Também gostavam de pintar-se com a s cores pretas e vermelhas. Com o contato com os missionários passaram a pintar a imagem da cruz na testa. Com o aumento da colonização os mongoiós passaram a vender seus produtos às tribos e as aldeias vizinhas.
As festas eram regadas a cauim bebida à base de milho, feita pelas mulheres. Curiosamente, elas tinham que mastigar o milho. Após a mastigação, o milho era cuspido em um recipiente feito do tronco da barriguda preparado para esta finalidade. Acrescentava-se água fervendo e levava ao fogo.
Banquete da morte:
Conta o príncipe que: “João Gonçalves depois de ordenar a seus homens que tivessem as armas prontas, convidou todos os índios para uma festa e, enquanto confiadamente se entregavam à alegria, foram cercados de todos os lados e quase todos mortos”.
Construção da Igreja Matriz:
A primeira Igreja Matriz foi iniciada por João Gonçalves da Costa em 1803. Foi coberta em 1806 conforme se conclui pelas inscrições com esta data, quando da sua demolição em 1932. Em 15 de agosto de 1809, ainda inacabada, foi realizada a primeira missa por um Padre da vila de Rio Pardo (Minas Gerais).
Em março de 1817, como registrou o Príncipe maximilian, ainda estava em construção. Foi inaugurada sem os altares e decoração em 1823. A pintura interna e decoração do teto foram terminadas em 1848, pelo pintor italiano João Pirasoli. Portanto, 45 anos depois. Por certo, a demora na construção se deve às dificuldades no transporte de materiais vindos da capital em lombo de burros.
Em 31 de maio de 1919, o intendente Ascendino Melo sanciona a lei de desapropriação da Igreja em função das rachaduras das paredes que causavam preocupação. No entanto, a demolição só aconteceu em 1932.
Em 15 de agosto de 1932 foi lançada a pedra fundamental para a construção da nova Igreja. Em edição de seis de agosto de 1944 o Padre Palmeira publicou no jornal “A Conquista” sob sua direção, o artigo “A Nova Igreja Matriz”. “É um templo soberbo cuja construção se deve a operosidade e tenacidade de um frade: Frei Egídio de Elcito”.
“Quando pode uma vontade que quer, quando essa mesma vontade, nos seus apelos insistentes, faz eco na consciência esclarecida do povo católico”.
“A futura Catedral de Conquista nasceu da energia de um homem alimentada pela generosidade de um povo”.
Cinema:
O cine Íris nasceu por conta de querelas políticas, na época se alguém fosse ligado a uma facção partidária e criasse uma filarmônica, por exemplo, logo era identificada como pertencente ao grupo tal e, assim, o adversário tratava logo de fundar a sua. Por isso, tínhamos a “Aurora”, interada ao Meletes, e a “Vitória”, dos Peduros. Se fosse jornal, acontecia a mesma coisa: “A Palavra” defendia os Peduros e “O Conquistense” aos Meletes. Com o cinema aconteceu assim: um senhor de nome Ubirajara chegou a Conquista e adaptou um cinema em um galpão existente no beco que hoje tem o nome de travessa Lima Guerra. Os freqüentadores levavam cadeira e bancos para se sentarem. Ubirajara aproximou-se dos Peduros e seu cinema tornou-se também Peduro. Maneca Moreira, chefe dos Meletes e muito rico, construiu o Cine Iris, com trezentos e cinqüenta cadeiras. Um luxo para a época, pois o prédio foi edificado para este fim, onde funcionava a Radio clube na Pç. Barão do Rio branco.
Mudanças de nomes:
Vitória da Conquista até chegar a este nome, passou por outros três nomes: em 1806 era conhecida como ARRAIAL DA CONQUISTA ou ARRAIAL DA VITÓRIA; em 09/11/1840 passou a ter o pomposo nome de IMPERIAL VILA DA VITÓRIA com a posse da primeira Câmara. Com a chegada da República em 1889, ficou proibido qualquer nome que lembrasse a época da Monarquia, por isso em 1891 passou a ser chamada de CIDADE DA CONQUISTA. Finalmente, em 1943 passou definitivamente a ser nossa “VITÓRIA DA CONQUISTA”.
Houve outra tentativa de mudar o nome para Saracota ou Conquistânea.
O saudoso historiador Mozart Tanajura conta em seu livro História de Conquista, que em 1945 foi criado o conselho Nacional de Revisão para fazer a revisão de nomes de cidades que tivessem dois nomes ou nomes que trouxesse insatisfação. Em Vitória da Conquista, foi criada uma comissão para esta finalidade que propôs ao então prefeito da época o Sr. Gerson Sales que mudasse o nome de vitória da Conquista para SARACOTA ou CONQUISTÂNEA. Graças à intervenção de Bruno Bacelar de Oliveira, que fez ver ao prefeito a origem e importância do nome de Vitória da Conquista conseguindo assim que o nome de nossa cidade fosse mantido. Em pesquisa sobre o significado do nome saracota, não obtive êxito. No entanto, a única cidade no mundo com este nome fica no Chile.
Passagens do Pe. Palmeira:
O padre Palmeira, nascido em Alagoas, político por vocação, de grande cultura humanista, orador nato, tanto sacro quanto profano, polêmico, tinha muita presença de espírito e raciocínio rápido e irreverência.
Foi Secretário de Estado em 1963 no governo de Lomanto Júnior, ocupando a pasta da Secretaria de Educação e Cultura. Com o Golpe Militar de 64, e a aproximação do governador das forças dominantes, acabou perdendo o cargo de secretário. Conta o Sr. Sebastião Leite, que após ser exonerado do cargo de secretário, o governador, que tinha muito apreço pelo Pe. Palmeira enviou um emissário até a casa do Padre, com a missão de convidá-lo para, na primeira oportunidade, comparecer no Palácio do Governo para tomarem um uísque. O emissário, após conversas de praxe, assim procedeu, fez o convite como o governador pedira. O Pe. Palmeira então respondeu da seguinte forma: diga ao governador que eu “uisqueci”.
João Torres me apresentou a crônica de Antonio José Nascimento contando sobre a polêmica e mais picante passagem do Padre Palmeira, foi com o Prefeito Edvaldo Flores. Em 1958, o Padre solicita do prefeito a retirada de um jumento morto em frente ao Ginásio de Conquista. Obteve como resposta que o jumento não seria retirado enquanto o padre não encomendasse o corpo; no dia seguinte fez a tréplica: “como posso benzer o corpo, se a família não pediu?”
Repetindo certo candidato a Deputado e ex-prefeito de uma cidade, saiu com esta: “Povo de minha terra, se aqui tem escolas criadas, foi eu quem as criôlas; se tem ruas calçadas, foi eu quem as calçoulas, mas se não me elegerem Deputado, eu saio da vida pública e volto para a privada”.
Quando candidato a Deputado Estadual, ao fazer um comício em Itambé, a esposa do candidato a Prefeito pediu sua orientação para falar em público alegando ser muito tímida. Num repente falou: “pegue o microfone e solte o verbo, basta falar igual e no mesmo tom de quando você está brigando com seu marido”.
Como homem público ganhou muitos apelidos saídos dos palanques dos adversários, como: Homem de saia, urubu de saia, agourento, corvo, etc. Mas revidava no mesmo tom, apelidando os adversários de: Engole ele paletó, Gavião de Penacho e outros.
De outra vez um vereador lançou um panfleto afirmando que o Pe. Palmeira era pai de um garoto e se recusava a aceitar a paternidade. O Padre Respondeu: “Dizem por aí que eu sou um homem de saia, mas estão enganados, debaixo desta saia tem um pijama, debaixo deste pijama tem uma cueca, e debaixo desta cueca tem uma PALMEIRA”.
Caixeiros Viajantes:
Vitória da Conquista, sempre foi um entreposto comercial, favorecida pela sua localização geográfica. Antes da construção da linha tronco da Rio-Bahia, os comerciantes (chamados de CAIXEIROS) já se destacavam no crescimento da cidade e as lojas eram supridas através de lombos de burros conduzidos pelos Caixeiros Viajantes, conhecidos no passado como Cometas, que foram de grande importância para o desenvolvimento da cidade, nos tempo difíceis. Por onde passavam, eram recebidos com todas as honras, eram questionados sobre as notícias da Capital, os coronéis queriam saber sobre a política, além de comprarem jornais, mesmo que atrasados. Cada viajem durava em média sessenta dias. Eles se apresentavam a rigor em todos os momentos, não abrindo mão do terno branco e bem engomado, além de chapéu e bengala.
As firmas fornecedoras ao contratarem os viajantes, procuravam os solteiros de boa aparência e bem falantes, por isso os cometas impressionavam as filhas solteiras dos ricos coronéis e acabavam se casando.
Com o tempo, passaram a acompanhar as mercadorias pela via férrea, a “Maria Fumaça”, até as cidades chaves onde passava o trem: santo Antônio de Jesus, Jequié, Brumado, Senhor do Bonfim, Juazeiro, etc., a partir daí seguiam com as tropas para atendimento dos clientes.
A festa dos cometas no final dos anos 40 foi um encontro dos caixeiros viajantes de caráter nacional, com a presença de muitos políticos e autoridades da época. Realizada no Clube Social, vizinho ao Hotel Albatroz, teve a presença da famosa cantora Emilinha Borba.
Marco: construção da Rio-Bahia. Era o sonho de todos. Após sua conclusão a população dobrou, o comércio tomou impulso, a cidade progrediu, o transporte ficou fácil, a ligação com o sul do país facilitou a chegada de produtos industrializados, e ganhamos o título de “Capital do Sudoeste da Bahia.
BATALHAS:
Barulho do Tamanduá:
No ano de 1895, Vitória da Conquista presenciou uma das lutas mais violentas de sua história entre as famílias do Cel. Domingos Ferraz de Araújo e da viúva Lourença de Oliveira Freitas, ambas com ligações de parentesco.
Um acontecimento fútil, a morte de uma vaca do Coronel, que teria sido morta pelos filhos de Lourença (Calisto, Sérgio e Gasparino), ou por causa de uma quarta de mandioca, não se sabe ao certo, foi o motivo inicial do conflito. Afonso Lopes Moitinho, genro de Domingos Ferraz, foi agredido pelos filhos da viúva. Tempos depois, investido de autoridade policial saiu em perseguição aos irmãos e acabou por matar Sérgio e Gasparino que se encontravam enfermos em sua casa, sob a legação de resistência à prisão.
Afonso e Calisto tinham temperamento violento e de muita coragem e não mediam as conseqüências de seus atos.
Assassinados os filhos, Lourença foi à cidade implorar por justiça conduzindo os corpos. Por não ter sido ouvida em testemunho policial, deixou-os insepultos no cemitério local, dizendo: “vocês mataram os meus filhos, agora coma-os.”
Nesse tempo Calistinho, como era conhecido, havia fugido para as Lavras Diamantinas, onde conseguiu a amizades de alguns jagunços que lhe seriam úteis na vingança. Trouxe-os consigo a Conquista. Hospedou-os em Campo Formoso na casa do Major Martins, que era seu parente. Conseguiu com ele 50 homens armados. Saíram à noite e chegaram ao amanhecer na fazenda Tamanduá onde o Coronel Domingos residia, atacando-a nas primeiras horas do dia 20 de outubro de 1895.
Pegado de surpresa, mas com alguns jagunços às suas ordens, o fazendeiro resiste durante todo o dia. Sem munição e cercada por todos os lados, a residência é invadida. O jornalista Aníbal Viana contou que “Calisto e seus companheiros aproximaram ferozmente da Casa Grande e invadiram assassinando a todos com tiros, facadas e facãozadas, encontravam no interior da casa cerca de 22 pessoas, ficando o chão coberto de sangue”.
Depois da tragédia em que morreram quase todos, já que dois conseguiram escapar, o casarão foi saqueado levando tudo o que encontraram de valor. O casarão da fazenda foi transformado em cemitério e lá estão, ainda hoje, as sepulturas e os restos mortais da família.
Calistinho após a vingança dispersou os jagunços e fugiu para Minas Gerais, onde foi perseguido e morto a mando de parentes da família que foi dizimada.
A tragédia do Tamanduá, como ficou conhecida na crônica sertaneja, teve repercussão regional, tendo sido lembrada durante muito tempo pelos poetas nordestinos que sobre o assunto escreveram Abcês e cantos romanceados.
Peduros e Meletes:
De 1916 a 1919, apesar das famílias se constituírem numa endogamia, eminentemente rural, houve vários desentendimentos entre o Cel. José Fernandes de oliveira Gugé, que liderava o poder dominante, e o Cel. Manuel Emiliano Moreira de Andrade, Maneca Moreira, que liderava a oposição.
A imprensa, surgida em 1910, ajudou a acirrar os ânimos com publicações políticas contundentes entre intelectuais, a exemplo de Manoel Fernandes de Oliveira, Maneca Grosso, que escrevia para o jornal “A Palavra”, e assim ia-se definindo os dois grupos de forma acirrada.
Com o falecimento do Cel. Gugé em cinco de agosto de 1918, tido como pacificador, as divergências aumentaram e briga armada foi difícil de ser evitada.
O Juiz de Direito da Comarca era acusado de agir de maneira imparcial, conduzindo as decisões sempre favoráveis aos Meletes, grupo do qual se achava ligado pelo diretório político.
A luta armada se deu na manhã do dia 19 de janeiro de 1919. Os homens do sobrade de Paulino Fernandes, foi demolido para a construção do Banco do Brasil, atiravam contra a trincheira dos Peduros em frente ao sobrado. O tiroteio durou o dia todo. Antes, houve troca de tiros onde morreu o fazendeiro Teotônio Andrade e saiu ferido Tibúrcio Freitas. Também morreram vários jagunços.
Como a luta continuava, um grupo de pessoas composto pelas Senhoras Laudicéia Gusmão, Henriqueta Prates dos Santos, Eufrosina Freitas Trindade, Fulô da Panela, e Joana Angélica Santos (viúva do Cel. Gugé) saíram em meio à contenda empunhando bandeira branca, apoiadas pelos Senhores Dr. Crescêncio Silveira, Dr. Nicanor Ferreira, Agripino Borges, José Maximiliano Fernandes Oliveira, Cel. Deraldo Mendes Ferraz e o Major Belizário Mendes, segundo narra Anibal Viana, intercederam aos combatentes e conseguiram por fim à luta mediante certa condição: a do Juiz “sair da cidade montado em um boi” como castigo às suas provocações. Novos pedidos demoveram os Peduros da humilhação imposta ao Juiz, e ele subiu a serra do Piri piri (Piri em Tupi significa brejo) montado em um cavalo rumo a Salvador. Maneca Moreira transferiu-se com todos seus familiares para a cidade de Poções onde ficou residindo, não antes de terem assinado um acordo de paz.
Pacto de não matar:
O ódio, no entanto, persistiu entre Peduros e Meletes por algum tempo, até que ambos resolveram fazer as pazes, assinando um acordo, em 21 de janeiro de 1919, de acordo transcrição abaixo, para que não houvesse mais entre as duas partes qualquer tipo de vingança.
Nós abaixo assinados temos firmados a bem da paz e tranqüilidade de Conquista, evitar toda espécie de vingança contra qualquer cidadão, ficando sujeito as penas da lei e sem ampara de nenhum de nós todo aquele que transgredir esta clausula.
Cidade de Conquista, 21 de janeiro de 1919.
Zeferino Correia de Mello, Manoel Fernandes de Oliveira, Deraldo Mendes Ferraz, Virgílio Mendes Ferraz, Manuel de Oliveira Santos, Antonio da Silva Lemos, José Correia de Mello Freitas, Ascendino dos Santos Mello, Plácido Mendes Gusmão, José Wenceslau dos Santos Silva, Justino Gusmão, Cornélio da Silva Gusmão, José da Silva Gusmão, Manoel Januário de Andrade, João Gusmão de Oliveira, Manuel Emiliano Moreira Andrade, Rogério Ferraz Gusmão, João Fernandes de Oliveira Santos, Pompílio Nunes de Oliveira.
Reconheço verdadeiras as dezenove firmas supra que dou fé. Cidade da Conquista, 22 de janeiro de 1919.
Tabelião de Notas intº Joaquim Martim Bastos.
Origem dos nomes:
Conta Anibal Lopes Viana, em sua Revista Histórica, que certo dia um amigo e correligionário de Cel. Maneca Moreira atravessava a antiga Rua Grande, montado em um cavalo, conduzindo um melete, espécie de Tamanduá. Partidários do Cel. Gugé começaram a vaiar o cavaleiro e este irritado gritou: “Os amigos do Cel. Maneca Moreira são como meletes que são bichos fortes, de coragem e quando agarram não soltam mais. Vocês são uns peduros de raça ruim, sem preço e sem valor”. Deste dia em diante quem era partidário do Cel. Maneca Moreira ficaram com o nome de “Meletes” e os do Cel. Gugé, com o nome de “Peduros”
Desenvolvimento:
A região de Vitória da Conquista, compreendendo os municípios de Barra do Choça, Planalto e Poções, devido à localização em uma altitude próxima de 1.000m acima do nível do mar e por não ter geadas, sempre foi um produtor de café.
Entretanto a partir do ano de 1975 esta cultura agrícola foi incrementada com financiamentos subsidiados pelos bancos oficiais, passando a região a ser a maior produtora do norte e nordeste do Brasil.
A partir do final dos anos 1980, o município realça sua característica de pólo de serviços. A educação, a rede de saúde e o comércio se expandem, tornando a cidade a terceira economia do interior baiano. Esse pólo variado de serviços atrai a população dos municípios vizinhos.
Bibliografia:
Ymboré, pataxó, Kamaka. A presença indígena no planalto da Conquista.
Tanajura, Mozart. História de Conquista: crônica de uma cidade.
Viana, Aníbal L. Revista Histórica
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