sábado, 10 de agosto de 2019

FALAR SOBRE CINEMA INTELIGENTE É FALAR SOBRE TODAS AS COISAS


Por Silvia Marques*

Sim, falar sobre Cinema inteligente é falar sobre todas as coisas. Não me refiro à abordagens mais técnicas, que envolvem a análise de um roteiro consistente ou à beleza dos enquadramentos e movimentos de câmera. Me refiro à falar sobre o conteúdo fílmico e da sua linguagem quando ela diz respeito e está a serviço do conteúdo.

Falar sobre Cinema inteligente é falar sobre política, tanto nas macro como nas micro estruturas da sociedade. Política vai muito além de falar sobre impeachment, corrupção passiva e os escândalos variados que animam os nossos governos e governantes. Falar sobre política inclui analisar os mecanismos de poder da sociedade, que perpassam todas as instituições existentes: as políticas, as econômicas, as religiosas, as educacionais e a familiar.

Falar sobre Cinema inteligente é falar sobre cultura. E quando falo cultura não me refiro apenas a museus e óperas. Não me refiro à cultura como cultura erudita ou alto grau de instrução. Me refiro a cultura sob o viés da semiótica da cultura: cultura como um gigantesco conjunto de códigos comunicacionais que expressa todos os nossos modos de pensar, sentir, fazer e comunicar. Falo de cultura como nossos costumes, crenças e valores mais arraigados. Falo de cultura como as nossas dicotomias mais estridentes, nossa hipocrisia mais pútrida, nossos jogos mais perversos, nossos passatempos mais ingênuos, nossa absurda capacidade de sermos fascinantes e asquerosos em medidas praticamente iguais.


Falar sobre Cinema inteligente é falar sobre Psicologia e Psicanálise. Félix Gattari já havia nomeado o cinema como o divã do pobre em um artigo sobre as estreitas e íntimas relações entre Cinema e Psicanálise. Mais do que mostrar variados distúrbios emocionais e diferentes padrões comportamentais, o Cinema não deixa de realizar uma espécie de terapia com espectadores abertos para esta experiência.


Falar sobre Cinema inteligente é falar sobre História. Quantos filmes não permitem que não nos esqueçamos de personalidades e momentos trágicos , impactantes e decisivos para o entendimento do nosso tempo presente?


Falar sobre Cinema inteligente é falar sobre ética e estética. É por em debate os valores morais da nossa sociedade. É questionar o próprio conceito de beleza em sua multiplicidade.
Falar sobre Cinema inteligente é falar sobre o amor e seus mecanismos de estranhamento , redenção e condenação. Falar sobre Cinema inteligente é dissecar a raça humana com suas contradições, impulsos, paixões e misérias. Falar sobre Cinema inteligente é falar sobre a sexualidade em suas múltiplas faces.


Falar sobre Cinema inteligente é falar sobre as Artes de um modo geral. Cinema é uma arte síntese, que reverenciou e reverencia muitos artistas.


Falar sobre Cinema é falar sobre as Ciências e suas idas e vindas. Avanços e retrocessos. É falar sobre as mudanças na forma de pensamento.

Sim, falar sobre Cinema inteligente é falar sobre todas as coisas. Que pena que para a maioria das pessoas ver um filme é um mero passatempo e estudar e conversar sobre cinema seja apenas um sintoma de uma personalidade lunática. Os exemplos dados no artigo são meramente ilustrativos. A quantidade de filmes importantes é inúmera.







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