A HARPIA E O DRAGÃO
Na última viagem que fiz à Muralha do Grande Abismo no coração do ermo desolado, quando atravessava curta meseta na cumieira de uma colina já chegando ao final desta tive ampla visão da imensa paisagem que se estendendo abaixo chega até a linha do horizonte azul que indefinido não permite se saber onde termina a terra ou onde começa o céu. Não muito longe na planície abaixo um grande incêndio laborava forçando estouro de rebanhos silvestres e densas nuvens de gafanhotos com alarido ensurdecedor migrarem fugindo em debandada para longe das chamas e para todos os lados. Então ao levantar meus olhos para o céu do meio da tarde me espanto ao ver um enorme dragão vermelho cujo corpo era de leão, cabeça de serpente com três chifres e a cauda de anaconda; turrando e lançando fogo pelas ventas em labaredas para destruir na Terra tudo que nela existe. Seu urro estrondava forte, tão forte que fazia-se ouvir por todo o austral do grande continente. Estremecido batia meu coração diante do formidável cenário.
Uma harpia que pairava nas alturas mais acima, com seus olhos aguçados em busca de alimento, vê o estrago que o fogaréu faz na floresta dizimando todo o campo, habitat de seu sustento. Murchando as asas, num mergulho de enorme velocidade arte ferozmente em ofensiva e ataca o grande inimigo invasor por cima e atrás da cabeça com fortes bicadas em movimentos ágeis e precisos. O dragão rebate lançando em desespero longas chamas que no ar ogo se dissipam, não alcançando jamais a pequena e valente agressora. Embora desprovido do maravilhoso dom de expressão do pensamento – a fala – por algumas vezes eu vi a besta manear a cabeça ao observar a harpia em manobras no ar, e como que grandemente admirado, talvez cogitar sobre a enorme desproporção de porte e peso entre ele e a destemida guerreira. Contudo, a besta continuava tentando alcançar a ave com suas poderosas garras dianteiras, frustrando-se a cada instante ante o esquivar veloz da mesma que em manobras e reviravoltas disfere uma série de ataques com o vasado bico e as fortes garras no entroncamento da cabeça ao pescoço, atacando sempre por trás. A fera procurando desfazer-se do incômodo agressor estremece-se, todo corpo com violentas sacudidelas de cabeça. E mais a harpia finca suas também fortes garras nas carnes do pescoço da fera dilacerando com o bico os tendões de junção que ligam a cabeça ao corpo. Cai a noite deixando meio esmorecida a ave.
De espírito estremecido eu apreensivo assistia aquele espetáculo dantesco no céu iluminado pelo grande clarão do incêndio na terra. Então eis que da montanha do Norte uma águia tem sua atenção chamada pelo vermelhidão do incêndio; e ao vir na direção do grande fogaréu dá por conta não só da singularidade do combate, como também da grande desigualdade entre os contentores. Porquanto sem mais tardar parte velozmente e entra na batalha, logo de início fazendo com o roçar do bico na queda veloz um grande rasgo danificando a membrana da enorme asa direita da fera o que tira todo o equilíbrio do bicho em vôo. Num dado momento resolve pousar no lombo do monstro, ao tempo em que a harpia em vendo isto deixa seu ponto de ataque aos cuidados daquela que oportunamente veio em seu socorro. Ao bater das asas mais fortemente para compensar o escape do ar pelo rasgo, este mais aumenta cansado maior desequilíbrio do pesado corpo do dragão que percebendo a inutilidade dos disparos há muito já desistira do canhão de cuspir fogo.
E indômita noite adentro, e no céu prosseguia a batalha, já num plano mais baixo, na qual sem nada poder fazer eu também da terra tomava parte com o desespero de meu coração atormentado que descompassadamente pulsava ora batendo forte, e por vezes parecia parar a cada recrudescer dos ataques de ambas as partes.
Asas, eu iria se tivesse, em favor do depauperado dragão que a cada instante mais descia o plano de voo. Mas, não! Exclamei quase envergonhado deste meu impulso ora perverso ora não de sempre me bater pelo que está com a sorte menor. Não, do início ao fim minhalma anseia pela vitória das benditas aves que em nome do Bem, do céu vieram para esmagar a maldita Serpente voadora que em voos noturnos e investidas silenciosas há quase meio século vem lançando labaredas malignas causando grandes danos a minha terra onde habitamos eu e meu povo.
Saindo-me e deixando de lado tais pensamentos que por um tempo me envolveram, volto a peleja que agora já se passa diante de meus olhos no mesmo plano em que me encontro na colina coisa de cem braças acima da Planície. Neste instante meu peito estremece ao perceber que a águia já conseguiu romper os ligamentos que unem a cabeça ao corpo e a harpia já tem aberto enorme rasgo na outra asa da fera. O que vejo com meu coração em disparada, agora pela alegria incontida? A palavra Sagrada do Criador: O Triunfo do Bem sobre o Mal. O que se planta isto colher-se-á.
E já sem forças, vencido pela exaustão, de cabeça descaída, a harpia, a águia, eu e meu cavalo, maravilhados, a grande fera o Dragão destruidor de vidas precipitar-se no imenso brasil ardente do lago de fogo embaixo na terra, vimos
Nas calendas derradeira
de nov. 2018
Elomar F. Mello
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