A vida, em sua essência, é um campo de tensões, onde forças opostas se encontram em um abraço violento e necessário. É a luta incessante entre o que é e o que poderia ser, um diálogo eterno entre o instante que foge e a eternidade que assombra. A cada pulsar, a vida ergue-se como tese: vigorosa, cheia de promessas, afirmando seu direito de existir. Mas logo vem a antítese: o desgaste, a negação, o murmúrio do tempo que corrói até a pedra mais firme. A síntese, quando surge, não é um repouso, mas um novo conflito disfarçado de trégua. Tudo pulsa no ritmo dessa dialética cruel, onde o movimento é a única certeza.
E enquanto a vida se agita, o pensamento observa, paciente, como um escriba das eras. Ele não se limita ao instante; é um artesão da memória, costurando tramas com os fios frágeis do vivido. O pensamento transforma o caos em enredo, organiza o que é disperso, desenha linhas onde a vida insiste em espalhar pontos. É ele quem dá voz àquilo que a carne sente, mas não pode nomear. E, assim, cria narrativas — histórias lineares ou labirínticas, que tentam aprisionar a fluidez da vida em formas compreensíveis.
No entanto, a relação entre vida e pensamento não é pacífica. A vida, selvagem e desobediente, recusa as molduras que lhe são impostas. Ela explode em desvios, desmentindo as certezas do pensamento, zombando das narrativas que a tentam conter. O pensamento, por sua vez, insiste. Ele reescreve, reordena, busca sentido onde a vida só entrega caos. É um jogo de sombras e luzes, onde ambos se desafiam e se completam.
A dialética da vida exige ação, movimento, o enfrentamento do outro e de si mesmo. Já a narrativa do pensamento oferece um refúgio, uma tentativa de tornar inteligível o que nos escapa. E, ainda assim, uma depende da outra. Sem a narrativa, a vida seria um turbilhão mudo, um eterno presente sem memória. Sem a vida, o pensamento seria uma dança sem corpo, um fantasma à procura de substância.
Neste embate perpétuo, somos os protagonistas e os espectadores. Carregamos em nós a violência do conflito e a suavidade da interpretação. Vivemos como quem atravessa um rio caudaloso, mas contamos a travessia como se o curso fosse previsível. Entre a força que nos arrasta e a história que inventamos, seguimos — criaturas da contradição, filhos do devir, prisioneiros da eternidade que tentamos narrar.
Oliver Harden
Fonte: Facebook Anselmo Vasconcellos.