sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O CANTO DA SEREIA



ALUNOS DA CAP ESCOLA DE TV E CINEMA DA BAHIA QUE PARTICIPARAM COMO ATORES DA MINISSÉRIE "O CANTO DA SEREIA" ....ESTAMOS MARCANDO PARA ASSISTIR JUNTOS O PRIMEIRO CAPITULO DA MINISSÉRIE.....JUNTOS PARA COMEMORARMOS OS ALUNOS DA CAP ESCOLA DE TV E CINEMA DA BAHIA NO PRIMEIRO TRABALHO NA GLOBO.
MANIFESTEM-SE AQUI 

ESTREIA DIA 8/01/2013 APÓS O big brother.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

OS MELHORES FILMES DE 2012

Os melhores de 2012




1.) FAUSTO (Faust), de Aleksandr Sokurov, com Johannes Seiler (Fausto), Anton Adasinsky, entre outros. Discípulo de Andrey Tarkovsky, Sokurov, realizador notável pela maneira na qual se utiliza da linguagem cinematográfica (A arca russa é um exemplo de experimentalismo radical com o plano-sequência), encerra a sua tetralogia dos homens políticos numa reflexão sobre a ânsia humana da conquista do poder. A essência do mito de Fausto (tão bem exposta por Murnau numa obra-prima do expressionismo alemão ainda no tempo do mudo) encontra aqui a sua postura contemporânea. É o melhor filme de 2012.

2.) A SEPARAÇÃO (Jodaeiye Nader az Simin), de Asghar Farhadi, com Leila Hatami, Peyman Moadi, Sarina Farhadi. Depois do boom e certo esgotamento do neorrealismo iraniano dos sapatinhos perdidos, um filme adulto, denso, com uma visão ácida e crítica da sociedade iraniana. Um homem, após se divorciar, vê-se obrigado a contratar jovem para cuidar do pai que sofre de Alzheimer, mas ela se encontra grávida, trabalhando sem o consentimento do marido. A realidade pulsante de uma sociedade presa a grilhões da intolerância. Urso de Ouro no Festival de Berlim.

3.) MISTÉRIOS DE LISBOA, de Raoul Ruiz., com Adriana Luz, Ricardo Pereira, outros. Realizador barroco e com acentos surreais, dono de uma filmografia de 117 filmes, este filme surpreendente, ainda que seus 275 minutos de projeção (4 horas e 15 minutos), não perde o seu encanto no decorrer do tempo. Uma viagem em torno da Portugal de Camilo Castelo Branco a partir de uma condessa obcecada pelo ciúme e sedenta por vingança, um próspero homem de negócios com passado de pirata sanguinário, um padre que de aristocrata e libertino se converte em justiceiro, e um garoto órfão em colégio interno. Filme que se coloca à parte na mediocridade atual do cinema contemporâneo e um dos mais belos do ano que ora se finda.

4.) ESSENTIAL KILLING – MATAR PARA VIVER (Essential KillING), de Jerzy Skolimowsky, com Vincent Gallo, Emmanuelle Seigner. Thrillerangustiante e político, quase sem diálogos, realizado pelo talento incomum de Skolimowsky (O ato finalO Uivo...), obra de impacto pela condução da narrativa, pelo seu aspecto minimalista e pelo extraordinário uso das cores. Capturado pelo exército norte-americano no Afeganistão, um homem é enviado para um centro de detenção secreto situado  na Europa de Leste. Como um animal em fuga, perdido naquela paisagem branca e gélida, ele tem apenas uma opção de sobrevivência: obedecer aos seus instintos mais básicos.

5.) COSMÓPOLIS (Cosmopolis), de David Cronenberg, com Robert Pattinson, Kevin Durand, Sarah Gadon, Juliette Binoche, Mathieu Amalric, Paul Giamatti´. Nos insólitos filmes desse canadense inventivo e inconformista, geralmente há a questão dos limites humanos na sua ambiciosa intervenção científica para uma mutação dos homens e das coisas. (Gêmeos – Mórbida semelhançamosca etc). Aqui, um dia na vida de um milionário especulador numa Nova York assolada pelo capitalismo cada vez mais selvagem. Estranho, perturbador, outro Cronenberg sempre bem-vindo.

6.) HABEMUS PAPAM (idem), de Nanni Moretti, com Michel Piccoli, Nanni Moretti, Jerzy Stuhr, Franco Graziosi. Um conclave no Vaticano para escolher um novo Papa não chega a um  consenso e decide por um desconhecido cardeal, que, não se achando preparado para a alta função, tem ataque de pânico e foge pelas ruas de Roma. O cinema italiano, que já foi, décadas atrás, um dos melhores do mundo, na sua decadência atual colhe poucos frutos, a exemplo desse filme de Nanni Moretti (que também trabalha como ator no papel do psiquiatra).  Sátira que oscila entre o trágico e o cômico, com acentos tchechovianos, pode ser considerado um dos melhores do ano.

7.) 007 – OPERAÇÃO SKYFALL (Skyfall), de Sam Mendes, com Daniel Craig, Judi Dench, Javier Bardem. A inclusão deste filme, entre os melhores do ano, é uma homenagem ao cinema-espetáculo tão banido quando a aferição do que é bom cinema se atrela mais à sisudez temática que, muitas vezes, detona uma operação fílmica mais voltada para a aporrinhação do que para o prazer. Dentro dos limites de seu gênero – cinema de gênero, portanto, e não de autor, Skyfall, que comemora os 50 anos do agente secreto criado por Ian Fleming nas telas, é um espetáculo que seduz pelo ritmo e pela repaginação de seus elementos de fábula.

8.) A MÚSICA SEGUNDO TOM JOBIM, de Nelson Pereira dos Santos. Exceção se faça a poucos documentários brasileiros (e, entre eles, os de Eduardo Coutinho), o que os caracteriza é o feijão-com-arroz do amontoado de entrevistas articuladas numa estrutura audiovisual gasta e repetitiva. O veterano Pereira dos Santos soube driblar a mesmice num filme feito somente com imagens e música sem a adição de vozes distantes a não ser aquelas que cantam as canções. E a música do maestro Tom Jobim promove a linguagem musical brasileira a um patamar de excelência e exclusividade. Não resta a menor dúvida: Jobim é o melhor compositor brasileiro de todos os tempos e o filme faz uma homenagem à altura de seu gênio.

9.) INTOCÁVEIS (Intouchables), de Olivier Nakache e Eric Toledano, com François Cluzet, Omar Sy. Após acidente de pára-quedas, rico aristocrata contrata jovem recém-saído da prisão para ajudá-lo no infortúnio. Apesar de gênios incompatíveis aparentemente, o passar do tempo determina que eles se compreendam, nascendo, daí, uma grande amizade. Os realizadores demonstram aptidão para a análise de comportamentos e o resultado é, simplesmente, surpreendente, revelando um excelente momento do cinema francês contemporâneo. O filme é pleno de observações interessantes sobre as idiossincrasias do ser humano.

10.) A INVENÇÃO DE HUGO CABRET (Hugo), de Martin Scorsese, com Asa Butterfield (Hugo Cabret), Bem Kingsley (Méliès), Sacha Baron Cohen (Inspetor da estação), Christopher Lee (Monsieur Labisse), Emily Mortimer (Lisette), Jude Law (pai de Hugo), Bem Addis (Salvador Dali),  entre outros. A ação se passa em Paris nos anos 30. Singela homenagem ao gênio de Georges Méliès feita por um ardoroso cinéfilo e cineasta. Méliès é o pai da ficção (Voyage dans la lune…) enquanto os irmãos Lumière do registro sem artifício. Scorsese, em seu primeiro filme em 3D, usa o processo para potencializar os efeitos mágicos dos filmes de Méliès. Magia e encanto. Encanto e magia.

Hors concurs: 
ESSES AMORES (Ces amours-là), de Claude Lelouch, com Audrey Dana, Laurent Couson, Samuel Labarthe. Lançado no ano passado, e, por não tê-lo visto, omitido da relação dos melhores, apenas o vi em 2012 em DVD, mas não poderia deixar de citá-lo aqui nesta relação. Quadragésimo terceiro filme de Lelouch, poeta das imagens e da mise-en-scène, do qual sou admirador inconteste, e que assinala os cinqüenta anos desse realizador na atividade cinematográfica, o filme é um painel sobre os encontros e desencontros de pessoas que abrange um tempo dramático de um século – aliás bem ao gosto do autor (Retratos da vida, Toda uma vida etc). Ces amours là, além do painel histórico, é, sobretudo, um filme sobre o amor e uma homenagem ao cinema e ao próprio realizador. Inspirado, sensível, poético, com partitura do sempre presente Francis Lai e Laurent Couson. A sequência final é um testemunho  de sua grandeza.

P.S: Entre os filmes nacionais, a neo-chanchada deu o tom negativo do cinema brasileiro, com mixórdias como Os penetras, De pernas pro ar 2, E aí, comeu?, entre outras, que fazem das antigas chanchadas obras-primas da arte do filme. As neo-chanchadas se utilizam da linguagem televisiva e não há, nelas, nenhum apuro cinematográfico. Destaco dois filmes do cinema nacional como os melhores do ano: O homem que não dormia, do baiano Edgard Navarro, e Febre do rato, de Cláudio Assis.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

IV BAHIA AFRO FILM FESTIVAL


C

Começa nesta sexta-feira, dia 16, o IV Bahia Afro Film Festival, festival de cinema afro que acontecerá até dia 21 de novembro, com programação em três espaços da cidade: o Forte Santo Antônio Além do Carmo, conhecido como Forte da Capoeira, Tv Pelourinho e Sala Alexandre Robatto.

A noite de lançamento tem uma programação especial, a partir das 19 horas, no Forte. Serão exibidos os curtas Yemanjá do Pelô, de Tamy Marracini, Homenagem aos Mestres, dirigido por Lázaro Faria, e A Resistência da Lua, do cineasta Otávio Bezerra.

Yemanjá do Pelô retrata a entrega do presente a Yemanjá pela comunidade do Pelourinho, buscando valorizar as raízes dos moradores e comerciantes do Centro Histórico e o resgate da sua autoestima. 

Homenagem aos Mestres é um documentário que retrata trajetória e lembranças sobre Mestre Prego e Neguinho do Samba, fundadores do Samba Reggae e do Olodum; Dois Mundos, produtor cultural e ator de cinema; e Beto Silva, compositor e cantor, autor de “Prefixo de Verão”, um dos maiores sucessos entre as músicas de carnaval de todos os tempos. O filme é lançado no festival, marcando as homenagens ao mês da Consciência Negra.

Resistência da Lua é um documentário realizado no final dos anos 70, na Cantina da Lua, sobre o surgimento dos movimentos culturais e negros no Pelourinho.

Estarão presentes ao evento os realizadores Octávio Bezerra e Tamy Marracini, o produtor cultural Big, João Jorge, presidente do Olodum, e o jornalista e agitador cultural Clarindo Silva, proprietário da Cantina da Lua.

Para encerrar, será realizada a Noite Black Kino, com DJ Branco, Edu Casanova e convidados.

BAFF

Mais de 30 filmes, entre curtas, médias e longas-metragens, poderão ser vistos de 16 a 21 de novembro, dentro da programação do IV Bahia Afro Film Festival. Realizado sempre em novembro – mês da consciência negra – o evento é uma iniciativa da Casa de Cinema da Bahia, produzido pela Celeiro Cultural, e tem como curadores Lázaro Faria e Elson Rosário.  

O festival tem como principal objetivo divulgar, integrar e promover discussões em torno da produção de cinema e vídeos nacionais e internacionais, que tenham o povo afrodescendente como tema principal.

Dentre as atividades realizadas durante o evento estão duas oficinas, uma delas básica de Produção Audiovisual, ministrada pelo cineasta Flávio Leandro, e a Tela em Transe, que tem como instrutor o cineasta Lázaro Faria, o cinematógrafo Xeno Veloso, a dramaturga Deusi Magalhães e a roteirista Carollini Assis. Cada oficina tem 30 bolsas destinadas a afrodescendentes. Ao final, serão realizados cinco curtas a serem exibidos no encerramento do BAFF.


Para a Mostra Competitiva, o júri oficial será composto pelos cineastas Flávio Leandro, Tamy Marracini e Flávia Cândida; pela diretora da distribuidora Americene do Brasil, Amélia Rebelllo; e Kátia Camargo, curadora da Mostra Paulista de Cinema Nordestino. A Associação Baiana de Cinema e Vídeo (ABCv / ABD-Ba) também realizará seu prêmio independente no BAFF, tendo como integrantes do júri a roteirista e diretora institucional da entidade, Carollini Assis; a produtora executiva de cinema, Márcia Nunes; e o fotógrafo Lúcio Mendes.  O prêmio Abcv será uma obra de arte do artista plástico de Vitória da Conquista, Arisson Sena.

A programação completa do BAFF pode ser consultada aqui:





segunda-feira, 12 de novembro de 2012

RESULTADO POSITIVO


Atores, alunos da CAP Escola de Tv e Cinema da Bahia e atores agenciados por Rada Rezeda participam com personagens da minissérie O Canto da Sereia, da Rede Globo, que está sendo gravada aqui em Salvador.                                                                                               Os mais de 20 alunos e atores agenciados fazem parte do elenco de apoio da minissérie e continuam gravando durante o mês de novembro. Vejam fotos no site da CAP Escola de Tv e Cinema da Bahia.http://www.capescoladetv.blogspot.com.br/

domingo, 11 de novembro de 2012

"Cascalho" no Cine Futuro em 35mm e Dolby

Caricatura urdida de Cascalho de autoria de Caó Cruz Alves
Filmes fora do mercado.

Por André Setaro


Cascalho, de Tuna Espinheira, tem exibição amanhã, segunda, dia 12, às 18 horas, no Espaço Itaú Glauber Rocha, dentro da programação do Cine Futuro. Outros filmes baianos também serão exibidos.
Transcrevo uma nota de Tuna.

Tuna Espinheira
e-mail: tuna.dandrea@gmail.com
 A propaganda é a alma do negócio, distribuir um filme é uma dura questão negocial, é preciso propagar/divulgar, e, neste caso fala mais alto o vil metal. O cinema jamais teve vocação para a clandestinidade. A arte do filme, em termos de vida e morte, necessita do aconchego da  luminosa tela grande do escurinho do cinema e do seu distinto público.  Apartado desta circunstância o ar fica rarefeito. É uma falácia a classificação de filmes de público e aqueles sem. Toda obra cinematográfica, (ressalvando a sua qualidade técnica/estética , de nível  aceitável), nunca ficaria clamando no deserto por falta de espectadores.
 Gosto não se discute, mas tem gente prá tudo. Violência, sexo explicito, dramalhão, segundo os esfarrapados comentaristas dizem, é o que o povo quer.
O imperialismo da indústria cinematográfica americana chega a ocupar a quase totalidade das salas exibidoras da terrinha, quando dos seus grandes lançamentos. O país expõe suas veias abertas, com um sorriso escancarado! Ser colonizado é isto aí! 
Lançar um filme, adentrar no mercado, é a hora e a vez de um número reduzido de filmes nacionais, motivo: custa muito caro.
Somos um povo sem Livrarias, Educação, Saúde, Desdentados, Descamisados, gado humano detentor da sexta economia mundial, segundo a classificação dos países ricos.
Muito semelhantes aos Cartolas do futebol, o cinema tupiniquim, também tem os seus, que decidem quais os filmes o povo quer ver. Vale não se perder de vista que todas as produções, incluindo aqui as chamadas independente e aqueloutras cheias de grana, no que diz respeito à produção e a distribuição, são dependentes do dinheiro público, jorrado das famigeradas Lei de Incentivo, e aqueles mesmos citados (os Cartolas) são os donos da bola e fazem girar a roleta, acintosamente viciada...
Urdi estes dois dedos de prosa para contraditar  crítica azeda dos que falam mal da agônica briga de foice ente filmes nacionais e mercado. O espaço é curto, mas é sempre bom lembrar que, neste assunto, o buraco é muito mais embaixo... 

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

È IMPORTANTE MANTER-SE CALMO

Beto Magno
Filmando uma baiana no "terreiro de Jesus"  Salvador - Bahia - Brazil.

A Direção de atores é mais do que uma profissão é uma arte que requer muita sensibilidade, conhecimento, técnica e principalmente percepção. Ser diretor não é ficar aos berros no SET dando ordens e muito menos ficar provocando constrangimentos na equipe e no elenco. Ser diretor e estar atento para tirar o máximo de proveito do que o ator e equipe pode contribuir para que sua cena seja bonita, tenha sentimento e principalmente transmita verdade para quem está assistindo e essa administração em busca da verdade do ator em cena com limitações técnicas não é fácil para ambos os lados seja na publicidade, cinema, TV ou jornalismo. Você precisa compreender para ser compreendido, um diretor tem que saber extrair do ator a sensibilidade e a técnica...

terça-feira, 6 de novembro de 2012

CINEMA AO ALCANCE DE QUALQUER "ZÉ MANÉ"


Por André Setaro


A avalanche de filmes digitais é impressionante. Qualquer pessoa pode, agora, fazer um filme e se intitular cineasta. O fazer cinema perdeu seu mistério e a sua magia. Claro, há a possibilidade de que qualquer se expresse por meio das imagens em movimento, o que é democrático. Ouso comparar o fazer cinema, hoje, com os poetas de antigamente. Em tempos não tão priscas assim, as pessoas viviam a cometer poesias e ficavam satisfeitas quando uma delas era publicada em jornais e revistas. Mas se existia muitos versos, poucos os poetas verdadeiros. Tinha-se, na verdade, uma enxurrada de versejadas.
Aplico o dito aos filmes feitos em digital por qualquer mané. O lixo da história está cheio desses arroubos expressivos e o tempo será o seu maior juiz. Pelo que tenho visto, a maioria dos filmes realizados em digital é de péssima execução cinematográfica, principalmente os curtas realizados por amadores. Para se fazer um filme é necessário, salvo raras exceções (como o documentário filmado in loco), uma elaboração a priori, um pensar cinematográfico antes da execução propriamente dita. Os cineastas digitalizados, porém, na sua grande maioria, preferem pegar a câmera e ir logo filmando. Os resultados, como não poderiam deixar de ser de outra forma, são lamentáveis.
Nelson Pereira dos Santos, numa palestra no Memorial da América Latina, há algum tempo, disse que não gostava da expressão audiovisual para a denominação de tudo que fosse imagem em movimento. Qualquer filme é chamado de produto audiovisual, o que, para ele, não expressava bem o significado e a dimensão do cinema. Quando se fala cinema, segundo Nelson, vem logo à mente nomes como Orson Welles, Fellini, Luchino Visconti, Roberto Rossellini, entre outros, ao passo que quando se fala em audiovisual nada vem à lembrança. Concordo em gênero, número e grau com esta opinião.
Está a acontecer uma revolução no audiovisual e ainda não cheguei a um processo mais consciente do que se encontra por vir. As imagens em movimento perderam a sua magia de somente serem vistas nas salas exibidoras e tomaram uma amplitude nunca dantes imaginada. Estão por toda parte: nas gigantescas televisões de plasma, nos DVDs, nos celulares, nos computadores. Baixa-se filmes a torno e a direito pela internet. O filme, algo meio inacessível, como em coluna passada me referi com um caso, hoje se vulgarizou a tal maneira que se pode encontrar no balaio das Lojas Americanas obras-primas a preço de banana. Ou espalhadas pelo chão das ruas e avenidas das cidades em cópias piratas. É verdade que, nesta oferta, predominam os filmes inferiores, para consumo imediato, mas, de repente, vê-se um grande momento do cinema à disposição do cliente transeunte.
Os eventos cinematográficos se proliferam e em qualquer cafundó de judas há atualmente a realização de um festival de cinema (apoiados, diga-se assim de passagem, pelas burras da Viúva). Muitos deles são bons e proveitosos, mas não se pode negar que alguns cheiram a picaretagem. Abre-se uma produtora com fito cultural e basta apenas captar patrocínios. Os organizadores gastam o necessário e o troco fica com eles. Urge que os órgãos governamentais tenham mais rigor ao patrocinar tais eventos, pois muitos não passam de pura picaretagem.
Há também uma profusão de oficinas, mesas redondas e quadradas, seminários disso e daquilo, alguns chatíssimos, recorrentes, repetitivos. Para ficar num só exemplo: a das oficinas de crítica cinematográfica., que, geralmente, são realizadas em dois, três dias. Creio-as um absurdo, um non sense. Como se pode ensinar a ver um filme em tão pouco tempo? E, principalmente, criticá-lo? A crítica é a arte da paciência, como disse uma vez o grande Inácio Araújo. Antes de mais nada, o vestibulando a crítico deve ver e ver filmes e, para alcançar um razoável repertório cinematográfico somente o tempo está a seu favor. É preciso se entender que o cinema é uma estrutura audiovisual, que tem uma linguagem autônoma. A crítica, portanto, é um processo a posteriori. Mas, na geleia geral na qual se afundou o audiovisual, assim como todo brasileiro se considera um técnico de futebol, também se acha apto para criticar um filme. Confesso que ministrei uma oficina de crítica, mas, num processo de autocrítica, nunca mais a farei. Tenho, também, culpa no cartório, mas, creio no meu bom senso, e, se o tenho, não participo mais de tais oficinas, que, no meu bom tempo, conhecia-as para conserto de carros e bicicletas.
A concentração de filmes numa determinada mostra é contraproducente. Segundo Georges Sadoul, famoso historiador de cinema francês, na introdução de seu Dicionário de Filmes, os filmes gravados na memória tendem a se confundir. Conta que passou décadas a analisar uma sequência de determinada obra cinematográfica vista há muito tempo e que a tinha como fundamental. Quando teve a oportunidade de vê-la, constatou, estupefato, que ela não existia no filme que anunciava. Pertencia a outro.
Como no título da antologia de críticas de Antonio Moniz Vianna, um filme por dia é o ideal de contemplação de um cinéfilo - até poderia conceder: no máximo dois. Há pouco tempo, no entanto, os eventos cinematográficos que se faziam no Brasil não empurravam, cinéfilo abaixo, uma avalanche de filmes. É bem verdade que da profusão pode aquele que se interessa escolher os mais interessantes e deixar os outros para uma próxima ocasião - se a houver.
Cada vez mais fica imperativo que se refine o que se vai ver. O ideal também é que se refinasse mais o que está a ser produzido. Uma das metas do cinema brasileiro deveria ser esta: não aporrinhar o pobre do cinéfilo já tão aporrinhado com as coisas da vida

terça-feira, 23 de outubro de 2012

"Saló" - "Os 120 Dias de Sodoma", de Pasolini




É um filme forte, Saló, o derradeiro e agônico Pasolini, chocante para alguns, mas já sacralizado como uma obra de arte. A ação se localiza nos estertores do fascismo, precisamente em 1944, quando quatro oficiais libertinos e luxuriantes sequestram dezesseis pessoas para fazê-las passar, num castelo imenso e sombrio, as piores humilhações e torturas, além de abusos sexuais, perversões da pior espécie. Pasolini, inspirando-se num livro do Marquês de Sade, tenta, aqui, um retrato metafórico do fascismo e, por extensão, do poder que anula o homem,coisificando-o. Realizado em 1975, pouco antes da morte do cineasta, Saló se constituiu num grande escândalo e foi proibido em várias capitais do mundo, porque considerado obsceno, revoltante, um atentado à moral e aos bons costumes. Na verdade, é uma obra que dilacera, uma verdadeira descida ao inferno de um homem atormentado com os descaminhos do mundo e, principalmente, de sua Itália. A virulência é tão grande que prenuncia o desaparecimento de Píer Paolo Pasolini, um dos mais originais cineastas da história do cinema.

Idealizador do cinema-poesia em oposição ao cinema-prosa, Pasolini, assim como Glauber Rocha, mutatis mutandis,evidentemente, extrapolou o cinema. Foi um agitador cultural, com seus artigos inflamados, polêmicos, arrasadores, suas poesias, seu comportamento híbrido, seu homossexualismo declarado, um homem "a latere" do sistema, que gostava de conviver com a sordidez, com marginais nos becos mais nojentos de Roma. Morreu procurando saciar o seu apetite carnal. Mas um homem que tem tal comportamento é um artista? poderia perguntar alguém estranhado com tanta sordidez. Sim, um grande cineasta, um grande poeta, um intelectual de escola.
Por outro lado, foi capaz de se elevar na melhor versão para o cinema de um evangelho: O Evangelho segundo São Matheus(1967) é um filme extremamente poético, dotado de uma sensibilidade à flor do celuloide. Dedicado à generosa e doce figura do papa João XXIII, conta com atores não profissionais (à maneira do neo-realismo italiano mas não seguindo seus postulados). Na época de seu lançamento, causou admiração geral. A Igreja ficou sensibilizada e lhe deu o prêmio OCIC. Como um marxista pôde filmar com tanta beleza um evangelho? Perguntas que pipocaram na ocasião, mas visto o filme estas se desfizeram em profunda admiração pelo homem e pelo artista.

Lembro-me de Teorema, que vi pela primeira vez no antigo Liceu, numa pré-estréia num domingo de manhã. Fiquei estupefato nos meus 18 anos em 1968. Que filme admirável! Um anjo vindo não se sabe de onde (dos céus!) é o elemento deflagrador de um processo de transformação de uma família burguesa, cujo chefe é um rico industrial. O anjo é Terence Stamp no auge de sua carreira, que, irrompendo na celula mater,conquista e conhece (no sentido bíblico) a todos. Após o contato, as pessoas se transformam, tomando rumo diverso. A esposa do industrial, começa a andar de carro pelas ruas de Roma à procura de homens para saciá-la de maneira sádica. O filho começa a pintar quadros abstratos num acesso de loucura. A filha entra em processo catatônico. A empregada despede-se da mansão e retorna a sua pobre região, ascendendo, levitando, e no ar, é admirada pela população como uma santa. E o chefe dá a fábrica aos operários e sai nu, correndo e gritando pelo deserto. Do ponto de vista da fábula, Pasolini se utiliza do lugar fabulísticodo elemento deflagrador, assim como William Holden que chega à cidadezinha de "Férias de Amor" (o deslumbrante Picnic, de Joshua Logan) e provoca celeuma, assim como Shane que, no filme do mesmo nome, aparece num lugarejo para transformá-lo. Mas a essência pasoliniana é outra.

Édipo Rei, Medeia, a trilogia iniciada com Decameron, continuada com Os Cantos de Canterburry e As mil e uma noites (esta, mais fraca) são exemplos de um universo pessoal lúcido e corajoso. Inconformista in extremis, Pasolini não aceitava o establishment, lutando para quebrá-lo, modificá-lo. Quando se vê hoje um filme como "Beleza americana" e, a respeito dele, fala-se atabalhoadamente em 'virulência crítica' do american way of life, a única reação possível é o riso irônico. Um outro cineasta que incomoda, além do grande Buñuel, porque descobre as fraturas expostas de uma sociedade apodrecida, é Marco Ferreri, que, há tempos, não aparece por estas bandas. Veja dele, se o tem em DVD, Crônica de um amor louco. Mas sua obra-prima é A Comilança (La grande buffe, 1973).

Neste filme, vários amigos se reúnem numa casa interiorana para comer até estourar. O programa estabelece que não se pode parar de comer até o advento da morte. Alguns estouram literalmente. Ferreri é um cineasta singular, marginalizado, por esta singularidade, dos circuitos comerciais. Os amigos reunidos não comem, porém, qualquer coisa, mas pratos finos da haute cousine preparados por um deles, Ugo Tognazzi, um mestre-cuca de primeira, dono de restaurante. Philippe Noiret (o velho operador de Cinema Paradiso) é um juiz com problemas edipianos, Marcello Mastroianni, um piloto de avião. E, ainda, entre a turma, o grande ator francês Michel Piccoli. Quando reunidos, uma gorducha professora da vizinhança, Bárbara Ferreol, intromete-se na farra.

Já nos filmes de Pasô, como era chamado, há uma surpreendente naturalidade de registrar e observar as coisas mais escabrosas. O sexo, por exemplo, é visto sem nenhuma ênfase, com a máxima naturalidade. Pasolini é grande porque tem uma forma toda particular de expressar suas idéias, de oferecer à imagem cinematográfica um acréscimo, um acréscimo de sua personalidade esfuziante. Evidente que os moralistas de plantão sempre se chocaram com alguns de seus filmes. Lembro-me que uma vez apresentei Salô a uma turma de estudantes e alguns se retiraram enojados, sendo que duas belas e radiantes garotas simplesmente vomitaram em plena sala de aula. Mas aí é que está: o choque faz parte de sua estética. Seus filmes, não todos, são destinados a mostrar as fraturas expostas de uma sociedade podre e hipócrita.

Panorama exibe 70 filmes nacionais e internacionais

O CINEMA ATUAL NÃO QUER UMA IDEIA NA CABEÇA!


Arnaldo Jabor
Tenho visto muitos filmes de ação. Vou ao cinema com meu filho de 12 anos e já sou um entendido nas missões impossíveis, nas porradas, nas cidades destruídas, nas armas assassinas. Quando estou no cinema, tudo me parece perfeito, de uma eficácia absoluta, como se estivesse dentro de uma máquina de sensações programadas. Sou levado a um mergulho em suspense, em medo, em prazeres sádicos, tudo narrado em uma tempestade de 'planos' curtos, nunca mais longos do que quatro segundos, ao som de orquestras sinfônicas plagiando Beethoven ou Ravel para cenas românticas e Stravinski para violência e guerras, pois não há um só minuto sem música, tudo montado para não desgrudarmos os olhos da tela. Antigamente, os filmes 'comerciais' ou de ação apelavam para alguma comoção humana das plateias, histórias em que o 'bem' era recompensado, em que chorávamos ou ríamos desde o Gordo e o Magro até Hitchcock.
Hoje, passamos por uma maratona de emoções incessantes que nos exaurem como se fôssemos personagens daqueles mundos em 3D, de pedras e balas que nos voam na cara, atravessando túneis de ressonâncias visuais e sonoras que nos fazem em pedaços espalhados pela sala, junto com os copos de Coca-Cola e sacos de pipocas. Somos pipocas desses filmes. No entanto, quando saio do cinema, caio num grande vazio nas ruas barulhentas, feias e terríveis, onde tudo parece irreal.
Esses filmes são de uma eficácia assustadora, como seus heróis. Os roteiros são feitos em programas de computador especiais que não deixam respiros para o espectador. É preciso encher cada buraco, para que nada se infiltre na atenção absoluta. Os efeitos especiais são mais importantes que os conflitos psicológicos. Não importa o enredo; só o gozo da cena. O filme de ação busca na violência e nos desastres a mesma visibilidade total do filme pornô.
É uma nova dramaturgia de Hollywood: a estética do videogame, onde a personagem principal não é mais o "outro", mas nós mesmos, com o joystick na mão e nenhuma ideia na cabeça. Cresce uma cultura da incultura, a profundidade do superficial, a rapidez do julgamento, num mundo feito de fugazes e-mails, celulares tocando, corridas sem fim, vidas sem "roteiro".
Está fora de moda um filme para ser visto, refletido, com choro, risos, vida. O desejo dos produtores é justamente apagar o drama humano dentro de nossas cabeças. A ação na tela é incessante, o conflito é permanente, de modo a impedir o espectador de ver seus conflitos internos.
Ao contrário das obras comunas ou nazistas, que vendiam um "futuro", um paraíso soviético ou um Reich de Mil Anos, os EUA vendem o "presente". Americano não tem futuro. Só um enorme presente prático, feito de objetos e gadgets, serviços e sentimentos redentores. Por outro lado, nada é parte de um "complô" para nos "lavar o cérebro", nada disso. Não é uma propaganda consciente. Não há Comitê Central nem CIA, por trás. Os americanos são um produto deles mesmos, acreditam no que dizem. A sinceridade é sua arma total. O verdadeiro cinema político é o filme americano.
Logo depois da Guerra Fria, os filmes mostravam uma América em "frenética lua de mel" consigo mesma. Os Estados Unidos eram o país da "cultura da certeza". A ideia de 'paraíso americano' era a perfeição do funcionamento. Com o fim da Guerra Fria, os americanos ficaram meio desamparados, sem inimigos reais. Cultura paranoica não gosta disso. Com o 11 de Setembro, junto com as torres, caíram também a arrogância e o orgulho da eficiência. Deprimiram por uns anos, mas, retomaram a trajetória do mito americano e, assim como estão reconstruindo as torres gêmeas, voltaram a fazer filmes para reabilitar o herói americano, tão humilhado na horrenda era Bush.
Antigamente, sofríamos durante a trama, esperando que os heróis ou amantes fossem felizes no fim. Hoje, sabemos que tudo vai acabar bem, mas nos fascinam mais os infernos que eles terão de atravessar, para chegar a um desfecho fatalmente bom. A catarse chegará, mas antes temos amputações, temos bazucas estourando peitos, bombas e vemos que, mais importantes que as personagens, são as "coisas" em volta. Sim, as coisas. Personagem é só um pretexto para mostrar o décor. E o décor é um grande showroom dos produtos americanos, que são as verdadeiras personagens: maravilhosos aviões, os supercomputadores, a genialidade tecnológica. Neste neocinema épico século 21, as personagens não fogem de um conflito; fogem dos produtos.
E pior: não adianta se refugiar na arte. O cinema de autor ficou mirrado diante de tanta homérica violência. A arte pressupõe uma imperfeição qualquer, uma fragilidade que evoca a natureza perdida; a arte inclui a morte ou o medo, mesmo no triunfo das estátuas perfeitas.
A destruição que vemos na vida, a sordidez mercantil, a estupidez no poder, o fanatismo do terror, a destruição ambiental, em suma, toda a tempestade de bosta que nos ronda está muito além de qualquer crítica. O mal é tão profundo que denunciá-lo ficou inútil. Pela influência insopitável do avanço técnico da informação, turbinado pelo mercado global, foram se afastando do grande público as criações artísticas e literárias, as ideias filosóficas, os valores. Em suma, toda aquela dimensão espiritual chamada antigamente de 'cultura' que, ainda que confinada nas elites, transbordava sobre o conjunto da sociedade e nela influía, dando um sentido à vida e uma razão de ser para a existência. Na arte atual, não há vestígios de esperança. Vivemos diante de um futuro que não chega e de um presente que nos foge sem parar. Isso nos faz saudosos do presente como se ele fosse um passado.
Uma espantosa nova linguagem surgiu e cresce como um 'transformer' nas telas do mundo. E talvez, daqui para a frente, só essa língua aliviará um pouco nossa solidão, saciará nossa fome de ilusão. Só em filmes brutos e desumanos teremos o consolo do esquecimento.

domingo, 21 de outubro de 2012

NOITE DE CABÍRIA


Por André Setaro

Um dos momentos mais sublimes de Federico Fellini, este gênio das imagens em movimento, que marcou, definitivamente, o imaginário cinematográfico do século XX, a instituir uma marca tão pessoal em seus filmes, uma autoria tão completa que, a partir de "Oito e meio", todas as suas obras vieram com os títulos precedidos com seu nome: "Fellini Satyricon", "Fellini Roma", "Fellini Amarcord", etc. Se a Teoria de Autor, elaborada pelos críticos do "Cahiers du Cinema" pode ser contestada, porque consideraram autores alguns realizadores discutíveis, ela se aplica admiravelmente a Fellini, um autor completo na mais rigorosa acepção do vocábulo.
Cabíria (interpretação chapliniana de Giulietta Massina) é uma pobre prostituta romana, que, ingênua em relação a seus semelhantes, vê-se vítima de um homem pelo qual está envolvida sentimentalmente, mas que a atira, depois de roubar-lhe o dinheiro, ao rio. Em seguida, na sua peregrinação para alcançar a felicidade, ainda que o ambiente sórdido na qual se encontra inserida, é enganada novamente por um célebre ator cinematográfico (Amadeo Nazzari). E, finalmente, mais uma grande decepção, quando pensa que encontra a felicidade. O namorado, que Cabíria idealiza como companheiro, após roubá-la, a abandona brutalmente. Mas, humilhada, ainda encontra forças para sorrir, quando de volta à avenida noturna fica a apreciar jovens montados em bicicletas a percorrer as ruas de Roma. Momento sublime e de indescritível beleza.
Nesta história patética, Fellini descreve sua prostituta com a nobreza quixotesca do ser que sobrevive em meio dos egoísmos sociais, a radicalizar, por outro lado, a "exemplaridade" do personagem, não-realista senão "inventado" dentro de uma história real. O autor, desde "A estrada da vida", vinha sendo acusado, a receber severas críticas de seus pares, de ter se afastado dos postulados neo-realistas. Fellini respondeu que seus filmes procuravam o "neo-realismo interior" esgotada já a fase áurea do movimento. Sua ideologia, por assim dizer, se encontra imersa no mistério, a predestinação e a Graça, e encontra, aqui, em "As noites de Cabíria", campo para a exposição de um personagem-símbolo, embora não tão distante da Gelsomina-Carlitos (de "A estrada da vida"), que agora atinge o nível de uma Cabíria-Carlitos. Há, no filme, o registro da vida das prostitutas, a histeria religiosa, mas, por outro lado, um vislumbre das zonas irracionais de um catolicismo que não deixa, porém, de ser inconformista em muitos de seus aspectos.
Na filmografia de Federico Fellini, iniciada em "Mulheres e luzes" ("Luci del varietà, 1950), pode-se distinguir três fases: a primeira, que se caracteriza por um cinema de imagens surpreendentes, mas dentro de um esquema narrativo tradicional que tem na sua força poética a transcendência do academicismo. Ou, por outras palavras: o elo sintático (a linguagem) ainda se encontra a serviço do elo semântico (o conteúdo).
Significativos dessa fase, além de "As noites de Cabíria" ("Le notti di Cabiria"), "Abismo de um sonho" ("Lo sceicco bianco", 1952), "Os boas-vidas" ("I vitelloni", 1953), "A estrada da vida" ("La strada", 1954), e "A trapaça" ("Il bidone", 1955).
A segunda fase tem início em "A doce vida" ("La dolce vita", 1960), magistral afresco moralista e premonitório sobre a decadência da civilização ocidental ainda quase em meados do seu decurso. Aqui já não há uma continuidade dramática nos moldes tradicionais, pois não existe uma união de seqüências pelas formas habituais, uma linha condutora e sua unidade se opera somente no fundo. É o elo sintático que se mantém rigorosamente unido ao elo semântico num processo que se assemelha ao mosaico. "A doce vida" inaugura não somente uma outra fase na carreira de seu autor, mas, também, e principalmente, um corte longetudinal na história da arte do filme, que ficaria mais radical em “Oito e meio” ("Otto e mezzo, 1963). Neste, a geografia da ação se encontra esfacelada e o que a comanda é o tempo psicológico.
Mestre absoluto, a partir daí o grande "regista" começa a estilizar o seu próprio estilo. Mas ainda consegue romper o conceito da obra-prima (que sempre é uma para cada artista, a sua melhor, a sua obra mestra), com outros filmes que podem ser considerados obras-primas, a exemplo de "Fellini-Amarcord" e "Fellini-Casanova".
Há em "La notti di Cabiria" um desejo de transposição metafórica da noite para o dia, a prostituta a tentar abandonar o noturno trágico da prostituição pela claridade do cotidiano tranquilo e familiar.
Neste ponto, dá-se, aqui, a palavra a Walter da Silveira ("Fronteiras do cinema", 44/45): "Esse jogo antitético da noite para o dia, com maior valorização dramática e plástica da da primeira, não poderia deixar de provir de quem, ao menos por paradoxo, inclui entre as raras peças literárias que o influenciaram o tratado da magia de Eliphas Levi ou, entre as criaturas que desejaria encontrar, Cagliostro e São Francisco de Assis. Ou seja: de quem admira e aspira o sentimento mágico da vida.”
É Walter ainda quem fala: “Tal sentimento aparece no tema e na forma de “As noites de Cabíria”: o amor ao próximo que distinguia o “poverello” de Assis; o encantamento, que assinalava Cagliostro. Na substância, Fellini gostaria que todos os homens iguais, mesmo que todos os seres fossem irmãos, em vez de cruéis e falsários. Na síntaxe, Fellini estimaria que todas as idéias, mesmo que todas as emoções, se revelassem sem os artifícios da construção técnica, com a simplicidade misteriosa do despojamento das origens”

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

O HOMEM QUE NÃO DORMIA

Edgard Navarro e Luis Paulino dos Santos
Republico aqui um comentário já publicado de O homem que não dormia,um dos mais importantes filmes brasileiros dos últimos anos de autoria de Edgard Navarro.
Por André Setaro


A geografia da ação de O homem que não dormia, Igatú, cidade interiorana baiana situada na Chapada Diamantina, se reparte em diversos planos, incursionando mais no tempo psicológico do que propriamente no tempo geográfico. Edgar Navarro, neste surpreendente segundo longa, faz a opção pelo realismo fantástico, e o filme é um exorcismo de seus fantasmas recônditos, seus temores internos, sua vontade de por para fora, pelo condutocinematográfico, as aflições do artista. O realismo fantástico foge da lógica habitual, da organização racional das ideias, e, assim, O homem que não dormia é um delírio, uma alucinação, que entra pelos labirintos do universo onírico com acentos surreais. Não se pode exigir de sua estrutura narrativa um comportamento de acordo com os postulados do cinema realista, pois Ohomem que não dormia não o é.
Há, por assim dizer, um realismo, quando sua câmera capta as conversas na barbearia e no bar, entre outros poucos locais, que retrata com humor e verdade as falas e as maneiras do homem interiorano se comunicar. Nestas sequências, engraçadas pelos ditos, e compostas pelos tipos certos, surge o Edgar anárquico e desabusado, que analisa a condição humana à flor da pele. Os planos de uma realidade surreal estão na mansão do barão sobrenatural (interpretado pelo próprio autor com particular expressão), inclusive com a transformação da película em preto e branco.
O discurso cinematográfico navarriano é um discurso, portanto, vinculado ao fantástico. A projeção neste, no entanto, não deixa de revelar o homem em seu delírio gótico Cineasta de ex-abruptos, Navarro, depois de sua estreia no longa em Eu me lembro, ainda que mude de rumo temático, não desfigura o seu estilo bombástico. Se a obra de estreia é um filme no qual faz o seu amarcord, desligando-se de seus impropérios e devaneios superoitistas iniciais, e, mesmo, da fantasia alucinante de O Superoutro, em O homem que não dormia vomita seus filmes anteriores numa dimensão lúdica e, não seria exagero afirmar, purificadora. A exemplo do padre vivido por Bertrand Duarte que, no final, tira a roupa e, no meio da praça, realiza uma espécie de purgação. O homem que não dormia é, por isso mesmo, a purgação navarriana por meio das imagens em movimento.
Filme surpreendente pelo apuro da produção, pelo desenho de arte excepcional (o casario onde vive o Barão, cheio de mofo, traças, o bar etc), pela fotografia funcional de Hamilton Oliveira, e, principalmente, pela maneira de Navarro organizar a estrutura audiovisual, As dimensão do real se bifurcam num processo simbiótico onde, às vezes, fica difícil distinguir as fronteiras do onírico com as da realidade do tempo geográfico já referido para alcançar um tempo, por vezes, meramente psicológico. Para aqueles que o acusaram de ser redundante na exploração de certos momentos nos quais há torrentes mijatórias, não se deve esquecer que se está diante de um filme de Edgar Navarro. Os dois cegos que se masturbam, por exemplo, é uma homenagem a Luis Buñuel, que declarou certa ocasião que era o seu desejo filmar uma cena com dois cegos assim procedendo. Tudo se encaixa perfeitamente em O homem que não dormia e o relato assombroso tem a haver com a busca do realismo fantástico, como já se disse, e se o filme pode escandalizar incautos, o escândalo é necessário, principalmente numa época, como a de hoje, do vale tudo escancarado, como sempre dizia o surrealista André Breton.
O homem que não dormia, vale ressaltar, é o filme baiano mais bem realizado dos anos 2000, superando, inclusive, Eu me lembro. O filme é visceral, e, nesse particular, preenche-se como obra de arte, como a expressão de um autor que não pretende dormir na sua ação executória como realizador de imagens em movimento.  A estrutura narrativa é uma estrutura onírica, inclusive com o acréscimo de poética animação. O filme caminha para a libertação como pode fazer sugerir o acesso do padre nos momentos finais e os balões coloridos que sobem lentamente para o céu. Teria Navarro, com isso, se libertado, pelo cinema, de seus fantasmas, para um terceiro longa mais suave e mais sereno? Ou o cinema não é o bastante para sacudir o inconsciente do artista, permanecendo, nele, intactos, seus delírios? 
Vou tentar desdobrar, aqui, a exegese interpretativa feita por Adalberto Meirelles em seu excelente blog. O filme, para Meirelles, é desenvolvido em três planos. No primeiro, o da realidade cabal, estrita, que tem a ver com o sonho e seus sonhadores. Os personagens sonham, vivem num mundo onírico, e o que sonham interfere com a realidade circunstancial na qual vivem.  Há, portanto, aqui, um postulado do surrealismo, quando a realidade exterior se bifurca com a realidade interior. Para os surrealistas, a realidade só merece consideração quando aglutina a exterioridade dela e a sua interioridade refletida nos transes, sonhos, alucinações, naquilo que se encontra escondido no inconsciente do homem ou no inconsciente coletivo. O segundo plano está afeito aos comentários sobre a realidade feitos pelos homens que frequentam a barbearia e o boteco da localidade, e, também, pelo contador de histórias que nos envolve em um mundo de sacis pererês e mulas sem cabeça, erguendo, com isso, a ponte para um terceiro plano. O plano do não-lugar fantástico, ancestral, dominado pelo poderoso barão cujo espírito paira entre aqueles sonhadores danados. Para que os sonhadores se libertem, ressalta Meirelles, eles precisam de uma prova de fogo. E ela se dará em um ritual de resgate simbólico do tesouro enterrado pelo barão.
E o grande Inácio Araújo soube ver O homem que não dormia sem os olhos do preconceito e da má vontade. Como diz em seu blog: "E, até pude entender, o filme tem uma coerência interna muito forte, é balizado por um fabulário (mula sem cabeça etc.), pela crônica política (o torturado da ditadura, transformado em louco da cidadezinha), pela permeabilidade do real pelo fantástico (os deuses nativos, tão presentes que contaminam até o padre), pela crônica de costumes (a maledicência e a tragédia familiar do coronel, que é outro lado da repressão e da dominação econômica)."
O argumento, tirado do blog do filme, diz o seguinte: "Cinco pessoas de uma cidadezinha são acometidas pelo mesmo pesadelo: um homem sinistro e seu tesouro enterrado. Com a chegada de um peregrino, o vilarejo é arrebatado da rotina medíocre e os personagens lançados num vórtice de acontecimentos insólitos. A verdade de cada um será então trazida à luz, libertando-os do jogo perverso das hipocrisias, medos e doenças, compelindo-os a assumir as rédeas de seus destinos e reescreverem suas vidas."
A fabulação de Navarro, portanto, é muito rica. E ele soube transformá-la convincentemente nas imagens em movimento. Se a fragmentação da narrativa pode confundir e por causa do hábito dos espectadores atrelados e acostumados ao modelo de narrativa griffithiana, com começo, meio, fim, estruturado de acordo com a lei de progressão dramático, do in crescendo. O homem que não dormia, porém, não teria a presença fílmica que tem se não fosse a direção de arte de Moacyr Gramacho, a fotografia de Oliveira, e a interpretação excelente dos atores, em especial Bertrand Duarte, como o padre recolhido o filme inteiro em suas dúvidas interiores (enquanto não está a ler Monteiro Lobato) e, que, de repente, explode no final. Além de Duarte (que já virou ator internacional com Dawson – Ilha 10, de Miguel Littin), Evelin Buchegguer (a mulher), Mariana Freire (Madalena), Fernando Neves (Coronel Abílio, um ator de grande presença cênica, que trabalhou em Eu me lembro como o pai intransigente), Ramon Vane (Pra Frente Brasil), Fábio Vidal (Vado), Harildo Dêda (talvez o maior ator baiano vivo numa ponta no final, quando se aproxima do padre – aqui, uma piada típica de Navarro), Nélia Carvalho (Dona Cora, uma senhora atriz, que faz a empregada dedicada no filme anterior), Fernando Fulco (o cego velho em impressionante caracterização – usando lentes de contatos azuis, está assombroso), Bertho Filho (o cego jovem), Julio Goes, como o sacristão, entre outros, a destacar, nestes, o peregrino interpretado por Luis Paulino dos Santos, que não é outro senão o cineasta que deu início às filmagens de Barravento e que, depois, sofreu um golpe na cintura dado por Rex Schindler e Glauber Rocha, ficando, este, como o autor do filme. Mas Paulino realizou outros filmes, entre eles, Mar Corrente, desconhecido e esquecido filme brasileiro com Paulo Autran. O preparador do elenco foi o talentoso Marcondes Dourado. E a produção de Sylvia Abreu (Truque).
O homem que não dormia foge dos padrões do cinema brasileiro atual e se posiciona como uma obra singular.